sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

I'm able to offer my love for centuries, but I have no time right now

O rosto branco de Bret e a linha de seu pescoço esbelto destacavam-se à luz do acetileno. A rua tornou-se novamente escura e beijei-a. Nossos lábios colaram-se. Depois ela se afastou e sentou-se tão longe quando pode, no banco.
- Não me toque - disse.- Rogo-lhe, não me toque.
- Que tem você?
- Não suporto isso.
- Oh! Brett.
- Você não deve. É melhor saber de uma vez. Não suporto isso, e é tudo. Oh! querido, procure compreender.
- Então não me ama?
- Como? Mas se me desagrego inteiramente quando você me toca!
- E não podemos fazer nada, realmente?
Brett agora estava ereta. Eu a rodeara com o braço, ela se encostava em mim e estávamos muito calmos. Brett me olhava bem nos olhos, com a sua maneira que nos fazia duvidar de que via realmente com seus próprios olhos. E os olhos continuariam a olhar, depois que todos os olhos do mundo tivessem cessado de olhar. Olhava como se nada existisse na terra que não tivesse ousado olhar assim e na verdade, tinha medo de tantas coisas!
- Não podemos fazer nada? - perguntei.
- Não sei - disse ela. - Mas não quero passar novamente por esse inferno.
- Então seria melhor que não nos tornássems a ver.
- Não, querido, tenho necessidade de vê-lo. E isso não é tudo, você bem sabe.
- Sim, mas acaba sempre nisso.
- A culpa é minha. Não pagamos por tudo que fazemos?
Não cessara de me olhar fixamente. Seus olhos tinham profundezas diferentes. Às vezes pareciam perfeitamente claros. Agora podia-se ver tudo neles.
- Quando penso nos pobres coitados a quem tenho feito sofrer! É por tudo isso que eu estou pagando.
- Deixe de tolices - disse eu. - Aliás, supõe-se que é muito engraçado o que me aconteceu. Nunca penso nisso.
- Oh! Não. Imagino.
- Escute, é melhor não falar em tal.
- Eu ri também, um dia. - Agora não olhava para mim. - Um amigo de meu irmão voltou de Mons nesse estado. Parecia muito divertido. Os homens nunca sabem de nada?
- Não, nunca se sabe coisa alguma.
Eu já havia mais ou menos esgotado o assunto. A um certo momento, tinha-o considerado sob os aspectos mais variados, inclusive o fato de que certos ferimentos e imperfeições são pretexto de brincadeira, embora permaneçam muito sérios para os que são vítimas deles.
- É engraçado - disse eu - , muito engraçado. E é igualmente divertido estar apaixonado.
- Acredita nisso, realmente?
Seus olhos pareciam novamente claros.
- Não digo engraçado nesse sentido. Por um lado, é uma sensação agradável.
- Não. - disse ela - Julgo que é o inferno na terra.

(Ernest Hemingway - O Sol Também Se Levanta)

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